Para compreendermos melhor as crises do profeta Jeremias, é fundamental conhecermos o contexto político e religioso de sua época, que descrevo nos parágrafos seguintes.
O rei Josias iniciou uma reforma religiosa durante o seu reinado, devido aos desvios cometidos por seus antecessores quanto à exclusividade da adoração a Deus no templo de Jerusalém. Neste período de reforma foi encontrado o “Livro da Lei” que de acordo com diversos autores, estudiosos do Antigo Testamento, faz referência ao Deuteronômio. Este fato foi fundamental para que Josias conduzisse o povo de Judá a renovar sua aliança com Deus. Paralelamente, Jeremias denunciava a idolatria e corrupção do reino do norte, Israel, direcionando os oráculos de Deus para este povo; o que pode explicar o fato de Jeremias não fazer referência ao acontecimento da reforma no reino do sul, Judá.
Além disto, deduz-se que, inicialmente, a reforma do rei Josias, no sul, dava esperança ao profeta de conseguir mudar a situação no norte. Todavia, talvez Jeremias percebesse os pontos fracos desta reforma, como a imposição pela violência em detrimento de uma conversão sincera do coração do povo. Assim descreve Jeremias 3,10: “apesar de tudo isso, sua irmã Judá, a traidora, não voltou para mim de todo o coração, mas sim com fingimento, declara o Senhor.”
Com a morte de Josias em 609 a.C., o rei Jeoaquim assume o trono de Judá, porém, este não deu continuidade à reforma de seu antecessor. Neste contexto, Jeremias entra em uma nova fase de sua proclamação, que cada vez mais se inter-relaciona com a sua própria vida. Há um rico conteúdo autobiográfico explicitado em um conjunto de textos que são geralmente descritos como as “confissões” de Jeremias. Começa-se a perceber o caráter solitário da atividade e da vida deste profeta, o que resultou em constantes crises existenciais.
Na esfera da política internacional, o império Babilônico expandia o seu domínio no cenário mundial, ocupando um lugar que anteriormente (722 – 650 a.C.) pertencia ao império Assírio, lembrando que este absorveu o reino de Israel em 722 a.C. Contudo, Jeremias prediz a destruição de Jerusalém e o exílio babilônico do povo de Judá, como castigo pelos seus pecados, e ataca a falsa confiança depositada no templo como garantia da presença de Deus, e conclama-os ao arrependimento.
Julian Martorell define este período na vida de Jeremias como o seu “Getsemâni”, e a sua vida converte-se no sinal de sua mensagem. O profeta é incompreendido, seu discurso não é aceito e ele enfrenta a oposição do rei, dos magistrados, sacerdotes, profetas; além disto, é abandonado por seus amigos e pela sua família. Estas situações caracterizam a crise que o profeta se encontra. Porém, em meio ao seu sofrimento, Jeremias fala de suas decepções, angústias e acusações contra Deus, mas aprofunda cada vez mais em sua vocação, demonstrando que este momento de crise culminou em um crescimento pessoal.
Em Jeremias 15, 15-18; percebem-se nas palavras do profeta o sentimento que ele experimentava diante da realidade de um vocacionado perseguido e que sofria privações por anunciar uma dura mensagem para o seu povo:
Tu me conheces, Senhor; lembra-te de mim, vem em meu auxílio e vinga-me de meus perseguidores. Que pela tua paciência para com eles, eu não seja eliminado. Sabes que sofro afronta por tua causa. Quando as tuas palavras foram encontradas, eu as comi; elas são a minha alegria e o meu júbilo, pois pertenço a ti, Senhor Deus dos Exércitos. Jamais me sentei na companhia dos que se divertem, nunca festejei com eles. Sentei-me sozinho, porque a tua mão estava sobre mim e me encheste de indignação.
Observa-se que Jeremias alterna momentos de desabafo e reclamações a Deus, com declarações de confiança da presença de Deus em sua vida. É impressionante constatar isto no capítulo 20, 7-14:
Senhor, tu me enganaste, e eu fui enganado, foste mais forte do que e prevaleceste. Sou ridicularizado o dia inteiro, todos zombam de mim. Sempre que falo é para gritar que há violência e destruição. Por isso a palavra do Senhor trouxe-me insulto e censura o tempo todo. Mas se eu digo: “Não mencionarei nem mais falarei o seu nome”, é como se um fogo ardesse em meu coração, um fogo dentro de mim. [...] Ouço muitos comentando: “Terror por todos os lados! Denunciem-no! Vamos denunciá-lo!” Todos os meus amigos estão esperando que eu tropece [...] Mas o Senhor está comigo como um forte guerreiro! [...] Cantem ao Senhor! Louvem ao Senhor! Porque ele salva o pobre das mãos dos ímpios. Maldito seja o dia em que eu nasci jamais seja abençoado o dia em que minha mãe deu a luz!
Neste período, são várias as crises circunstânciais enfrentadas por Jeremias. É ameaçado de morte, preso, rejeitado e impedido de entrar no templo; porém, o profeta se mantém firme em seu propósito de cumprir sua vocação, na certeza, ainda que oscilante em alguns momentos, de que Deus estava ao seu lado.
Em 597 a.C. Jeoaquim morreu, e o seu sucessor foi deportado para a Babilônia. Sedecias subiu ao trono. Jerusalém estava sitiada pelo exército de Babilônia e Jeremias, vivendo uma fase mais madura no seu ministério, pregava a rendição ao império babilônico. Porém, Sedecias defendia uma aliança com Egito. Aos olhos do profeta Jeremias era inútil se aliar a qualquer nação contra a Babilônia, não por questões antinacionalistas, mas sim por acreditar que se entregar a Babilônia fazia parte do plano de Deus, e a não submissão a vontade de Deus culminaria na destruição de Judá. Devido à sua posição, Jeremias foi preso, porém teve um último encontro com Sedecias, por iniciativa do próprio rei. Nesta ocasião, Jeremias reafirmou o conselho de se entregar, mas Sedecias, novamente, não ouviu o profeta. Em 586 a.C. Jerusalém foi completamente tomada pelos babilônios, Jeremias foi libertado e obrigado a ir para o Egito, onde terminou os seus dias ao lado de seus compatriotas.
Segundo Julián Martorell, Jeremias, aparentemente, teve sua vida permeada pelo fracasso e incompreensão, porém acrescenta:
Jeremias nos aproxima, como nenhum outro profeta, da verdadeira dimensão da vocação profética, de seus abismos de solidão e de abandono, de seus riscos e desafios, e dessa fidelidade última a uma palavra inflamada e introduzida nas entranhas, que pugna por sair vencendo todas as decepções e resistências.
O profeta Jeremias soube transformar suas crises em oportunidades de crescimento pessoal e aprofundamento no sentido de sua vocação. Era do seu relacionamento íntimo com Deus, e de suas firmes convicções que ele buscava recursos para enfrentar as crises e encontrar respostas para seus os questionamentos.
Portanto, aprendemos com este profeta que uma fé em Deus consciente e consistente, somada a um profundo conhecimento do sentido de vida, são fatores essências para a resolução de uma crise.
Um comentário:
Portanto, aprendemos com este profeta que uma fé em Deus consciente e consistente, somada a um profundo CONHECIMENTO DO SENTIDO DA VIDA, são fatores essências para a resolução de uma crise.
RESUMINDO: "no mais o SENHOR TUDO FARÁ..." pq essas duas coisas FÉ e SENTIDO DA VIDA eu acredito que só pode vir dEle.
RVFJ
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